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A Moema de Victor Meirelles

Da constância dos movimentos do mar, uma surpresa. A onda suave recua e nos entrega um corpo, que na areia fica, belo, esguio, perfeito, nu. Que, num primeiro momento, quase nos engana: este corpo, que nos excita e nos comove, vibra, e é pura luz. A abstração da cor ultrapassa os limites da forma, e a luz do corpo, tão nítida e limpa, funciona como instrumento de materialização da própria pureza. O corpo parece apenas dormir, em um repouso que espelha a serenidade das águas calmas que o devolveram à praia. Mas, de repente, esta luz nos choca, e se confunde com o contraste da morte. Sim, este corpo está sem vida. Os longos cabelos negros se esparramam e a cabeça ligeiramente se inclina, entregues ao movimento da água que acabara de passar por ali. Seu rosto é de uma calma beleza exótica. Entre sombras e curvas, uma das mãos descansa sobre o ventre. Penas de um ornamento cobrem sensualmente seu sexo, acompanhando o contorno majestoso do quadril.

A perna esquerda, apoiada a uma rocha, se sobrepõe à direita, oferecendo aos nossos olhos, ao percorrer todo o corpo, o prazer de um movimento ondeante. Emerge então um corpo que se define pelo contraste entre as cores escuras da água e da areia, que se misturam indefinidamente, entre marrons e verdes, à vegetação. Esta, por sua vez, se define pelo contraste entre as cores claras do céu, fruto de uma luz que desponta de um sol tímido. A mistura indefinida de tons se repete, onde marrons, azuis e verdes brincam com os limites do real, e céu, mar e terra viram uma ilusão. Entre ausências de luz, a vegetação revela, aos olhos atentos, pessoas, que acenam em direção ao mar.

Moema, Victor Meirelles, óleo sobre tela, 1866, 40 x 50 cm. Museu de Arte de São Paulo.

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